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História e Filosofia

Marcomede Rangel Nunes

Marcomede Rangel Nunes (1951 – 2010)

No dia 21 de agosto de 2010, com apenas 59 anos, a astronomia brasileira perdeu uma de suas figuras mais expressivas: Marcomede Rangel Nunes, carioca, físico, astrônomo, jornalista e com relevantes e reconhecidos trabalhos em astronomia.

Conheci Marcomede ainda jovem realizando observações sistemáticas do Sol no Observatório Nacional do Rio de Janeiro, CNPq-MCT. Seus conhecimentos, aplicação e idealismo contribuíram para que mais tarde fosse contratado para trabalhar neste Observatório. De colegas passamos a amigos mantendo estreito relacionamento. Falávamos quase semanalmente. Dizia sempre que Marcomede, em razão da competência e espírito sempre alegre, comunicador e brincalhão, era único. Participamos juntos de inúmeros eventos.

Várias vezes esteve em Americana, SP, participando da nossa “Semana de Astronomia” e cursos. Era um incentivador e ‘plantador’ de relógios de Sol em todo o Brasil. O mais famoso deles é o de Brasília em parceria com Oscar Niemeyer. Era também um profundo conhecedor de planetários. Suas frequentes viagens aos Estados Unidos e a Europa visitando fabricas e planetários, tornaran-o um especialista no assunto. Visitou entre outras a fabrica Carl Zeiss, em Jena, Alemanha, a mais famosa e conceituada do mundo. A implantação do Planetário de Belém, ‘Sodré da Gama” da UEPA, teve uma participação decisiva do Marcomede.

Ao lado do insigne astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, colaborou na criação do Museu de Astronomia e Ciências Afins, MAST, do Rio de Janeiro, RJ, no prédio do Observatório Nacional. Participou no Programa Antártico Brasileiro realizando sete viagens aquele continente. Pelo ON e o Instituto de Estudos Antárticos, IBEA, foi o primeiro brasileiro a medir a radiação solar na Antártica com um pirômetro Eppley 8-48. Escreveu vários livros dentre os quais : Oku-curi (1979); Uma Luz Diferente no céu (1985); Antártica, uma Viagem ao Topo do Mundo (1980); Santos-Dumont, um Astrônomo Amador (2006); Einstein no Brasil (2005) e Meteorito de Bendengó (2007). Foi também autor de mapas do céu, do sistema solar e da Lua. Por ocasião do Projeto Apollo (1968-1972) colaborou no Programa LION, NASA, JPL, Smithsonian Institution. Pelos relevantes serviços prestados a astronomia em mais de 40 anos de carreira exercidos no ON, recebeu inúmeras homenagens e condecorações dentre as quais vale destacar: Diploma ‘Amigo da Marinha do Brasil’, Medalha Pedro Ernesto, Medalha Alda Pereira Pinto, Medalha Tiradentes, Mérito Tamandaré da Marinha do Brasil, Personalidade Sayb Mais 2005, Profissional em Destaque e Benemérito do Estado do Rio de Janeiro.

Prédio Original do Observartório Nacional (ON), hoje Museu de Astronomia (MAST), no Rio de Janeiro.

Por iniciativa sua, fui surpreendido com uma Moção de Votos de Louvor e Aplauso pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro por minha atuação em astronomia, sendo como sou natural do Estado do Rio de Janeiro. Marcomede foi um incansável colaborador e muito atencioso por todos que o procuravam. Muitas mentalidades voltadas ao estudo do céu deva-se a ele. Chamávamos carinhosamente de “Marcomidia” tamanho era seu conhecimento. Estava a par de tudo. Quando esperávamos levar-lhe um novidade, ele já sabia !

O Clube de Astronomia do Rio de Janeiro, CARJ, O Grupo NGC-51, os observatórios Nacional e do Valongo, UFRJ, o Planetário do Museu do Universo na Gávea e todos nós, colegas, amigos e admiradores de todo Brasil, rendemos nossa homenagem e um preito de gratidão por tudo que ele nos proporcionou. Esteja onde estiver, certamente seu espirito paira entre as estrelas que tanto amou. Numa homenagem, embora simples pelo tanto que ele contribuiu para a astronomia brasileira, a Biblioteca do Observatório Municipal de Americana,SP, a partir de 01/09/2010, passou a denominar-se “Biblioteca Astrônomo Marcomede Rangel Nunes”.

6 respostas em “Marcomede Rangel Nunes”

Em 1972, na época em que estudava Engenharia Mecânica na PUCRJ, fui participar de um curso de Astronomia e Astrofísica no Observatório Nacional.
No meio dos participantes havia um rapaz magrinho e ágil, da minha idade, de cabelo crespo, bigode e cavanhaque, muito comunicativo – o Marcomede Rangel Nunes. Ele já estava trabalhando há quatro anos no O.N., no Setor da Hora e também em pesquisas solares. Nas horas vagas do nosso curso, ele adorava mostrar as instalações locais aos visitantes, e pude conhecer então as cúpulas com as lunetas astronômicas de 46, os locais de pesquisas, os relógios de sol, a oficina onde um astrônomo português ensinava a confeccionar espelhos parabólicos e a montar telescópios, etc. Algumas vezes desci com ele o morro do Observatório, junto com outros colegas, indo até a padaria comprar os nossos lanches dos intervalos das aulas. Eu sempre o achei uma pessoa empolgada com o que fazia. Ficamos amigos, e eu ainda tenho uma foto dele ao lado do meu velho Fusca 65.

Depois de concluir meu estágio de Iniciação Científica (bolsa do CNPq) de três anos, sob a supervisão do Mourão, minhas visitas ao O.N. se tornaram mais raras. Numa delas, em janeiro de 1986, por coincidência estive com o Marcomede no dia em que estava sendo divulgada a explosão da nave Challenger, que nos chocou a todos. No mesmo ano encontramo-nos novamente no Planetário da Gávea, que promovia uma exposição sobre o cometa Halley, Na ocasião, ele autografou para os meus filhos o livro que estava lançando – “Uma luz diferente no céu”, colocando a seguinte dedicatória: “À Viviane e Sérgio, um abraço cósmico. Marcomede”.

Continuei como astrônomo amador (hoje com um Schmidt-Cassegrain de 180 mm). Via sempre suas entrevistas pela TV, e seus comentários sobre os eventos astronômicos. Também acompanhei com interesse as suas viagens à Antártica, e as suas atividades pioneiras. Participava de vários grupos da comunidade astronômica, que certamente ainda sente muita falta da presença do grande incentivador Marcomede, que nos deixou há mais de três anos, em julho de 2010.

Ronaldo, que história interessante e bonita. Obrigado por compartilhar.

Eu também estive em 1986 no Planetário da Gávea, onde trabalho hoje, para observar o Halley. Meus pais me levaram para observar o cometa, pegamos uma senha, e, pelo tempo que demoraria até chegar nossa vez, me lembro que voltamos para casa, tirei um cochilo, e eles me acordaram de madrugada para voltarmos e observarmos o cometa. Muito lega lembrar disso! Essa foi apenas uma das coisas que fiz meus pais passarem durante a minha infância por causa de astronomia.

E um dos materiais mais legais e lúdicos que ganhei quando criança sobre o Halley foi exatamente um livro ilustrado que trazia um personagem que era uma caricatura sensacional do Marcomed!

Leandro, era grande a expectativa pela volta do Halley devido ao fato de que a última aparição, em 1910, fora grandiosa, tendo aquele corpo celeste apresentado um grande brilho e uma longa cauda.

Porém, o que houve em 1986 foi um fiasco. O que se conseguiu ver a olho nu foi no máximo uma pequena mancha enevoada no céu. Durante o mês de março, na melhor época para observá-lo, apontei minha luneta de 40X para o cometa e pude ver a mancha da cabeleira e uma pequena cauda, esta com o comprimento de cerca de dois diâmetros daquela mesma mancha – e só.

Chegou-se à conclusão que três fatores contribuíram para a pouca visibilidade dessa última aparição:

1) Em 1986 a distância mínima do cometa à Terra foi de cerca de 63 milhões de km. Na aparição anterior, em 1910, o Halley chegou a aproximar-se a 23 milhões de km, tendo nosso planeta atravessado parcialmente a sua cauda gasosa.

2) Em 1986, a passagem pela Terra deu-se três meses após o cometa ter atingido o seu periélio (distância mais próxima ao Sol). Em 1910, a aproximação mínima com a Terra aconteceu um mês após a passagem periélica, quando a interação do “vento” solar com a cabeleira do cometa ainda era intensa, resultando numa extensa e fulgurante cauda.

3) A forte iluminação das cidades atuais, aliada à poluição atmosférica, ofusca bastante a visão dos fenômenos celestes, em especial os de menor brilho. Nos anos 10 do século passado, em plena “belle époque”, a atmosfera das cidades era límpida, e a luz tênue e romântica dos lampiões de gás não interferia com as belezas do céu.

No meio daquele ano de 1986, conversei com as minhas duas tias mais idosas (tia Glorinha, 85 anos e tia Célia, 87 anos), que tinham sido testemunhas da passagem do cometa em 1910 quando ainda eram crianças e moravam no interior de Minas Gerais. Tia Glorinha, que já tinha problemas de visão e usava óculos na época disse que viu um borrão de luz comprido no céu. Porém tia Célia contou que viu nitidamente o cometa, e achou linda a grande cauda quase pousada sobre o horizonte.

Sds, Ronaldo R. A. Câmara

Ronaldo, que privilégio ter duas testemunhas da memorável passagem de 1910, ainda mais que estavam no interior de Minas! Perfeito!

Nunca tinha pensado nesse fator da diferença na iluminação entre 1910 e os anos 1980. Com toda a certeza isso intensificou o fiasco cometário. Devia ser lindo poder observar um céu estrelado em plena cidade.

O que vi no antigo telescópio que ficava fixo no anfiteatro do planetário (apelidado de “azulzinho”) foi um mancha esbranquiçada, semelhante a uma nebulosa, mas com um vestígio de cauda beeeeeeeeeeeeeeeeeeeem fraquinho. Não sei o quanto minha empolgação e imaginação na época contribuíram para melhorar a imagem.

Você lembra que aquele ano de 1986 foi chamado de o ano “C”? Tivemos: Copa, Cometa e Cruzado 😛

Forte Abraço, Ronaldo!

INFELIZMENTE HOJE CHORO POR SUA DESPEDIDA. MAS ATÉ HOJE ME LEMBRO DO DIA EM QUE CONHECI PESSOALMENTE ESSE FANTÁSTICO HOMEM UMA VERDADEIRA LENDA PARA ASTRONOMIA. QUANDO EU ERA GAROTO COMO ME DEU INCENTIVOS PRA EU NUNCA DESISTIR DOS MEUS IDEAIS E DOS MEUS OBJETIVOS !… E FOI O GRANDE MARCOMEDES QUE ME FILIOU AGRADEÇO PELA MINHA ENTRADA NO CLUBE DE ASTRONOMIA DO RIO DE JANEIRO…DESCANSE EM PAZ E PERTO DAS ESTRELAS O SENHOR QUE TANTO AS AMOU VÁ COM DEUS E QUE DEUS TE GUARDE EM UM BOM LUGAR

Tive o prazer de estar em Macapá, em um dos equinócios , dentre vários observados por Marcomedes neste belíssimo lugar, e pude ter o prazer de desfrutar de seus conhecimentos e sua companhia! Grande perda para astronomia brasileira!

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