No dia 25 de abril de 1672, era apresentado ao mundo um dos projetos ópticos mais engenhosos e duradouros da história da Astronomia: o telescópio Cassegrain. O artigo que descrevia o novo telescópio foi publicado no Le Journal des Sçavans, o mais antigo periódico científico europeu.
Criado pelo francês Laurent Cassegrain (~1629–1693), esse tipo de telescópio refletor introduziu uma ideia genial: usar um espelho secundário convexo para refletir a luz de volta por um orifício central no espelho primário. Isso encurtava o tubo óptico e melhorava a ampliação, tornando os telescópios mais portáteis e precisos.

Sabemos pouco sobre Laurent Cassegrain. Ele nasceu na França, na região de Chartres, por volta de 1629 (não há certeza sobre o ano exato). Era padre e professor em 1654 e, no fim de sua vida, lecionava ciências no Collège de Chartres, uma instituição de ensino equivalente ao que hoje conhecemos como ensino médio. Faleceu em Chaudon, uma pequena comuna rural no departamento de Eure-et-Loir, em 1º de setembro de 1693.

Apesar de pouco reconhecido em vida, Cassegrain teve sua invenção perpetuada. Hoje, quase todos os grandes telescópios profissionais utilizam variações de seu projeto. Uma dessas variações são os telescópios Ritchey-Chrétien (também chamados RTC ou RC), que possuem dois espelhos hiperbólicos. Eles foram desenhados para eliminar uma aberração de imagem conhecida como coma, que ocorre devido a imperfeições nos componentes ópticos, produzindo uma imagem distorcida com uma cauda e uma nebulosidade, parecida com a coma de um cometa. Os dois mais famosos telescópios espaciais são exemplos de telescópios RC: o James Webb e o Hubble.
Uma das versões mais populares entre astrônomos amadores é o Schmidt-Cassegrain, que combina o design compacto do Cassegrain com uma lente corretora esférica na entrada do tubo. Essa lente, chamada placa de Schmidt, corrige aberrações esféricas, que ocorrem quando os raios de luz que incidem sobre um espelho esférico não convergem no mesmo ponto. Telescópios Schmidt-Cassegrain são amplamente usados em astrofotografia.
Outra variação dos telescópios Cassegrain são os Nasmyth-Cassegrain, que utilizam um terceiro espelho para enviar a imagem para a lateral do tubo, em vez de passar por um orifício no espelho primário.
Além desses, outras variações notáveis são:
- Maksutov-Cassegrain: similar ao Schmidt-Cassegrain, mas com uma lente corretora esférica espessa (a chamada “menisco Maksutov”), que proporciona grande correção de aberrações com excelente contraste de imagem.
- Argunov-Cassegrain: usa elementos totalmente refletores, com o espelho secundário composto por múltiplas superfícies planas, eliminando a necessidade de superfícies hiperbólicas ou lentes corretoras.
- Klevtsov-Cassegrain: combina um espelho secundário esférico com uma lente corretora posicionada entre os espelhos, mantendo boa correção óptica e sendo mais simples de fabricar do que designs RC.
A geometria Cassegrain também não se limita à luz visível: ela é amplamente empregada em antenas parabólicas de rádio e micro-ondas, onde o refletor secundário redireciona o sinal para um receptor posicionado atrás do refletor primário, reduzindo interferências e aumentando a eficiência do sistema.
Os telescópios Cassegrain estão no espaço, em grandes observatórios, mas também em lojas de telescópios amadores. É uma invenção do século XVII que continua olhando para o Universo no século XXI.
Bons Céus!
Veja abaixo uma lista de notáveis telescópios Cassegrain dos quais você já ouviu falar mas não sabia que erm Cassegrain!
1. Very Large Telescope (VLT) – ESO, Chile
(Conjunto de quatro telescópios ópticos no Deserto do Atacama)
- Configuração: Ritchey-Chrétien (uma variação do Cassegrain)
- Detalhes: Cada um dos quatro telescópios principais de 8,2 metros tem um design refletor com espelho primário parabólico e secundário hiperbólico. O foco Cassegrain é utilizado, mas também possuem saídas Nasmyth para instrumentos laterais.
- Local: Cerro Paranal, Deserto do Atacama, Chile

2. Subaru Telescope – Havaí
(Telescópio de grande abertura com uso versátil em espectroscopia e imagens profundas)
- Configuração: Cassegrain (com opções Ritchey-Chrétien e foco Nasmyth)
- Detalhes: O Subaru, com espelho primário de 8,2 metros, utiliza o foco Cassegrain para espectrógrafos e câmeras de alta resolução. Possui grande estabilidade térmica e óptica.
- Local: Mauna Kea, Havaí, EUA

3. Telescópio Canadá-França-Havaí (CFHT)
(Telescópio de médio porte)
- Configuração: Cassegrain clássico
- Detalhes: Utiliza espelho secundário convexo e primário parabólico, em uma configuração muito próxima do projeto original. Possui mecanismos para troca entre os focos Cassegrain, Prime e Nasmyth.
- Local: Mauna Kea, Havaí, EUA

4. Gemini Observatory – Norte e Sul
(Par de telescópios gêmeos voltados ao hemisfério norte e sul celestes)
- Configuração: Cassegrain modificado / Ritchey-Chrétien
- Detalhes: Os telescópios Gemini North (Havaí) e Gemini South (Chile) utilizam espelhos de 8,1 metros em sistema RC com múltiplos focos, incluindo Cassegrain, Nasmyth e Coudé.
- Local: Mauna Kea (Norte) e Cerro Pachón (Sul)


5. Keck Telescopes – Havaí
(Telescópios com espelhos segmentados de 10 metros)
- Configuração: Ritchey-Chrétien
- Detalhes: Embora os Keck usem espelhos segmentados em vez de monolíticos, seu sistema óptico segue o arranjo Ritchey-Chrétien, derivado do Cassegrain. São usados amplamente em espectroscopia de alta resolução e imagens profundas.
- Local: Mauna Kea, Havaí, EUA

6. Hubble Space Telescope (HST) – Órbita terrestre
(Telescópio espacial )
- Configuração: Ritchey-Chrétien
- Detalhes: Com espelho primário de 2,4 metros, foi projetado para eliminar aberrações como coma e esfericidade. Opera principalmente nas faixas ultravioleta, visível e infravermelho próximo, com extrema estabilidade e resolução.
- Local: Órbita baixa da Terra (~547 km de altitude)

7. James Webb Space Telescope (JWST) – Ponto de Lagrange L2
(Telescópio espacial )
- Configuração: Ritchey-Chrétien
- Detalhes: Seu espelho primário segmentado tem 6,5 metros. A luz refletida pelo espelho secundário convexo é enviada para instrumentos localizados atrás do espelho primário. Foi projetado para estudar o Universo primitivo, exoplanetas e objetos frios em infravermelho.
- Local: Ponto de Lagrange L2 (a ~1,5 milhão de km da Terra, no lado oposto ao Sol)
